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CURITIBA, QUINTA-FEIRA,
18 DE FEVEREIRO DE 2016
Diversão
&Arte
BEM
PARANÁ
Joy e seu filho Jack vivem isolados do mundo e só têm
contato de vez em quando com o “sequestrador”
Uma vida
paralela no
cativeiro em
O Quarto de Jack
Luiz Zanin Oricchio
Há filmes dos quais se
pode dizer muito do enredo,
sem estragar as surpresas do
espectador que ainda não os
viu. Em outros, como
O Quar-
to de Jack,
que estreia hoje,
toda cautela é pouca. Ainda
mais depois de a palavra
"spoiler" ser glorificada nas
redes sociais. Ou melhor,
usada como açoite contra os
que se atrevem a revelar
uma trama, mesmo se for o
óbvio de uma história de co-
nhecimento público. O que
não é o caso de
O Quarto de
Jack,
uma obra de ficção.
Feita essa ressalva, con-
vémdizer que O
Quarto de Jack
é, em primeiro lugar, um es-
tudo sobre o confinamento
humano forçado e, em segun-
do, sobre suas consequências.
Alguns detalhes tiram esse
longa do lugar-comum. São
notáveis atuações de Brie Lar-
son (indicada para o Oscar) e
Jacob Tremblay, como mãe e
filho, ou filha, que partilham
o mesmo aposento e convi-
vem, de maneira compulsória
24 horas por dia. Em segundo
lugar, mas não menos impor-
tante, e talvez até mais, o
igualmente notável trabalho
de direção de Lenny Abraha-
mson, que consegue extrair
boa dramaturgia de uma situ-
ação envolvendo primordial-
mente apenas dois persona-
gens, com eventuais intrusões
de um terceiro. Mostra que
joga bem em condições míni-
mas e não se perde quando
elas se alargam e se tornam
múltiplas.
Ou seja, pelo menos em
sua primeira metade, o filme
corria o risco de ser tremen-
damente entediante e limita-
do. Não é assim. De maneira
nenhuma. Com elementos
restritos de que falávamos,
Abrahamson transforma a
cena em uma dura luta pela
sobrevivência mental. Leva-
da, em especial por parte da
mãe. Numquadro de tão pou-
cas alternativas, ela precisa
convencer Jack de que aquilo
tudo tem um lado de brinca-
deira. Desdramatizar o que
experimentam, de forma que
sobrem energia e inteligência
para pensar numa saída.
Como se sabe, o pânico para-
lisa. O procedimento, lembra,
mudando tudo o que deve ser
mudado, o de Roberto Benig-
ni em
AVida ÉBela
, quando ten-
ta convencer o filho pequeno
de que a vida num campo de
extermínio nazista se parece
um pouco com uma gincana.
Abrahamson, por imposi-
ção da história, trabalha com
esses poucos elementos e,
manipulando-os com habili-
dade, faz da trama inicial um
poderoso suspense, no qual os
protagonistas conquistam de
maneira muito inequívoca e
rápida a simpatia do público.
Quando a plateia passa a "tor-
cer" pelos personagens, a me-
tade do jogo está ganha. Mas
só a metade. Porque também
será preciso desenvolver o res-
tante da trama e não se des-
fazer dos trunfos conquista-
dos anteriormente quando a
situação física mudar de ma-
neira radical.
E isso será feito pela dire-
ção segura do longa. Se a câ-
Ingressos
doFestival
deCuritiba
estãoàvenda
mera se aproveita bem do es-
paço fechado, também se va-
lerá dos planos abertos.
Não usa e abusa do que
seriam saídas fáceis - o escuro
num caso, a luz solar que bri-
lha, no outro. Abrahamson,
com seus matizes, parece in-
dicar que as mudanças das
condições reais dos persona-
gens não serão tão radicais
assim. Por alguns motivos. Por
exemplo, porque certas expe-
riências são traumáticas e con-
tinuam produzindo efeitos
Pormais uma edição,
o ShoppingMueller será
o ponto de vendas oficial
do 25º Festival de Curiti-
ba. A bilheteria, instala-
danoPisoL4, temoaten-
dimento ao público nos
horários de funciona-
mentodo
mall
: de segun-
da-feira a sábado, das
10h às 22h, e aos domin-
gos e feriados, das 14h
às 20h. O festival acon-
tecerá na capital do dia
22 de março ao dia 3 de
abril e os ingressos estão
àvenda apartir de ahora.
No Shopping Muel-
ler, podem ser adquiri-
dos ingressos para qual-
quer um dos espetácu-
los que serão apresenta-
dos no festival.
Desde 1992 o Festi-
val de Teatro de Curitiba
realiza edições e reúne
artistas e companhias de
teatro do Brasil e do ex-
terior para vivências ar-
tísticas no Sul do país.
Além do teatro forma a
programação, a dança, o
circo, o stand-up, o im-
proviso, o teatro físico e
até gastronomia ganham
espaços para seremapre-
sentados ao público em
todas as suas propostas
e inovações. Neste ano
mais uma edição do fes-
tival se aproxima, mar-
cando o 25° ano do even-
to em execução — que
será realizado entre 23de
março e 3 de abril.
SERVIÇO:
O quê:
Bilheteria do
Festival de Curitiba
Local:
Shopping
Mueller | Av. Cândido
de Abreu, 127 - Centro
Cívico | Piso Cinemas
Data:
de 15 de
fevereiro a 3 de abril
Horários:
Segunda a
sábado, das 10h às 22h
e Domingos e feriados,
das 14h às 20h
Tel:
41 3074-1000
Inf:
mueller.com.br
Facebook:
/
MuellerCtba
Twitter:
twitter.com/
muellercwb
Instagram:
@muellercwb
Mãe cria mundo particular para manter filho longe da realidade em que vivem
Tradição
muito tempo depois de haver
cessado as causas. São os ca-
sos de pessoas submetidas a
torturas ou a sequestros. Al-
gumas retomam a vida nor-
malmente, de onde ela havia
sido interrompida. Outras, le-
vam o cativeiro ou a violência
consigo. Ou guardam seque-
las que não cicatrizam, mes-
mo depois de anos. Às vezes,
não existe cura.
Em
OQuarto de Jack
, o con-
traste entre as duas situações
mostradas é nítido. No en-
tanto, se esse mesmo con-
traste fosse definitivo, a his-
tória poderia se tornar banal.
A inteligência que a faz me-
lhor do que poderia ter sido
manda que algo vaze de pri-
meira parte para a segunda,
da prisão para a liberdade.
Nesse ponto, é como se frus-
trasse, de certa forma, a ex-
pectativa da plateia que, ten-
do suportado a angústia da
primeira metade, espera al-
gum alívio ou catarse na se-
gunda. Esta lhe é negada.
Pelo menos, em parte. Será
preciso mostrar que nem
tudo se resolve com facilida-
de e que a reconquista da
autonomia não se dá de uma
vez, mas implica num longo
percurso, num trabalho paci-
ente e de resultado incerto.
Essa dificuldade, colocada
demaneira nítida por Abraha-
mson, é apenas aliviada por
um desses expedientes em
que o cinema comercial é pró-
digo (o filme tem esse aspec-
to, também). Como se o pro-
dutor da película implorasse,
ou impusesse, desfechos mais
nítidos, destinados a mostrar
ao público que os caminhos da
vida podem ser longos e difí-
ceis, porém recompensadores,
afinal de contas. É toda uma
ideologia do happy ending
que está em jogo e diz respei-
to não apenas ao cinema dito
comercial.
Os produtores de Fellini
também lhe imploraramo "ra-
ggio di sole (raio de sol)", que
recompensaria a todos pelos
sofrimentos do personagem.
Uma redenção, para usar a
palavra correta. Amaneira de
atender a essa imposição (ou,
eventualmente, negá-la) é
que distingue os cineastas
uns dos outros.
RÁPIDA
O Senhor Cinco Anos
Jack acaba de fazer 5 anos e é nesse ponto de sua vida que o conhecemos. É ele mesmo quem narra sua história — e a voz criada pela
irlandesa Emma Donoghue para o garoto é uma das graças de Quarto, livro publicado em 2010 (aqui, em 2011), que envolveu um polpudo
adiantamento de direito autoral, foi finalista do Booker Prize e conquistou leitores mundo afora — no Brasil, ele já está na 5.ª edição.
Donoghue é responsável, também, pelo roteiro do filme. Jack vive com sua mãe em um minúsculo cômodo. Para ele, está tudo bem: tem o
amor dela e se sente confortável ali dentro, onde os objetos são tratados como humanos e onde cada mancha, cada traço conta a história
delicada e angustiante dessa pequena família. Aquilo é só o que ele conhece da vida real. Na rotina — e na criança —, a mãe encontra um
antídoto à loucura e força.
George Kraychyk/divulgação